quinta-feira, 21 de julho de 2011

Desapego 2

Deixei para última hora a arrumação, pois imaginava que se tivesse que fazer tudo rapidamente não teria muito tempo para pensar... Que ingenuidade!
Resolvi começar pelas roupas dele que ainda estavam no armário...
Foi um sofrimento indescritível! Foi como se eu tivesse tirando do armário as roupas de alguém que havia morrido. O meu sofrimento foi tanto que o meu corpo doía, eu podia sentir os meus órgãos doendo.
E realmente ele morreu... O meu amor por ele morreu. Cada peça de roupa, cada objeto, os fardamentos, os sonhos, foram sendo arrancados um a um de dentro do armário, e de dentro do meu ser.
Depois de tirar todos os seus objetos, a praga do armário é enorme, comecei a retirar os meus, que também estavam imantados da minha energia, dos meus sonhos, desejos, de objetos de uma vida em comum que durou nada menos que trinta e um anos, o guardanapo do dia do casamento, os bilhetes apaixonados, as fotos...
O fim se concretizando num outro estágio da separação.
Confesso que não tinha me dado conta de que essa situação me abalaria tanto. E doeu, doeu muito, uma dor física, quase insuportável.
E nesse processo, de retirar, acomodar os objetos do passado, fiquei indignada, pois mesmo no fim, eu estava arrumando e organizando as coisas para ele. Eu estava entre lágrimas e soluços, retirando e acomodando as coisas para que ele só tivesse o trabalho de levar.
Nesse processo houve um fato, que se não fosse trágico seria cômico. Havia uma espada, pois além da espada militar o dito é maçom e tem esses objetos do ritual e um deles é a tal espada. Algo pesado, que fazia parte do ritual num determinado nível, que ele já avançou.
Freud certamente, se vivo estivesse, e eu tivesse a oportunidade de deitar no seu divã, concordaria comigo que espadas e armas, que o ex sempre gostou, têm algo relacionado à fragilidade da sexualidade masculina. Seria isso?
Queria muito rir com esse gênio da psicanálise, já que em outros tempos e situações eu o achava viril e ao mesmo tempo assustador... Hoje? Bem, hoje há o vazio...
Pois que a tal espada, estava entre o fundo do armário e uma prateleira, e estava numa posição que se assemelhava à espada do Rei Arthur, tanto que eu tive que entrar no armário para “arrancá-la”.
Qual o poder que ela me trouxe? A liberdade para viver uma nova história.
Depois que o armário foi esvaziado totalmente, entrei no quarto e olhei ao redor... Não havia vida, nem energia, só o vazio que uma separação deixa. Frio, morte, medo...
Fisicamente eu estava acabada. Meus filhos ao final do dia, quando chegaram em casa depois do trabalho (ainda bem que eu estou em férias) ficaram preocupados com o que viram, pois me perguntaram o que havia acontecido.
O que eu gostaria de ter dito é que neste dia eu enterrei uma parte de mim, que eu estava de luto. Que neste dia, ao longo das doze horas em que estive envolvida com esse ritual, eu me confrontei com o fim, com a morte de uma história de amor que eu acalentei por tantos anos.
Mas me resignei em dizer: tive um dia difícil.

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